segunda-feira, 24 de novembro de 2008

(04/12) Eu cresci!!!/ Encontro XXX

Apesar de sempre questionar o modo como grande parte dos professores de Língua Portuguesa concebe o ensino da norma padrão, da leitura e da escrita, pouco fazia para romper com essa concepção. Entretanto, a partir do estudo do Módulo II e da realização da atividades propostas por ele, passei a investir em novas metodologias em sala de aula. Além dessa mudança, também tenho proposto aos meus colegas de escola muitas das reflexões que temos feito ao longo do curso. Tenho defendido o seguinte discurso: o professor, quando impõe ao aluno apenas o uso da norma padrão como "fala correta" , reforça o discurso que privilegia o preconceito lingüístico e desqualifica os indivíduos iletrados ou menos escolarizados como legítimos falantes do português brasileiro.
O curso, associado às atividades propostas pela tutora e às discussões nos 30 encontros, contribuiu para que eu pudesse rever conceitos importantes para o desenvolvimento da escrita e da leitura dos meus alunos. Conseqüentemente, o meu planejamento também foi revisto. Para o 4° bimestre, partindo do tema "Escola e Diversidade", preparei um roteiro de atividades de produção textual contemplando todos os gêneros. Assim, espero que os alunos possam relacionar os textos produzidos com a sua finalidade social. Para cada situação, os alunos serão esclarecidos sobre o propósito da escrita, o interlocutor do texto e a situação discursiva para que possam produzir textos adequados às necessidades apresentadas pela turma. Para que escrevam sobre o que consideram importante e para o público que querem atingir, haverá um momento voltado à pesquisa, à leitura e à discussão dos dados levantados sobre o tema. Desse modo, eles escreverão partindo de uma situação real: divulgar informações, emitir opinião, propor soluções para os problemas detectados, mobilizar os leitores para alguma iniciativa, denunciar atitudes e comportamentos, etc.
Eu cresci! As leituras e as conversas abriram caminho para uma reavaliação da minha prática pedagógica. Hoje defendo com veemência o ensino da língua que garanta ao aluno a possibilidade de ampliar o seu domínio do português. Isso significa, em outras palavras, investir em aulas de leitura e escrita (dos mais variados gêneros) a fim de que o desenvolvimento da competência interacional do aluno seja, de fato, contemplado e lhe possibilite monitorar a sua fala de acordo com as sua necessidades e o contexto discursivo.

(27/11) Quando a teoria bate à porta da prática/ Encontro XXIX

O curso me propiciou o encontro e o reencontro com a pesquisa e a leitura de forma mais intensiva. O estudo dos módulos 1, 2 e 3 da área específica desencadeou em mim a necessidade de rever o meu olhar sobre o ensino da Língua Portuguesa, seja no que se refere ao ensino da norma padrão em face das variedades e da mudança lingüística, seja no que se refere ao trabalho com a leitura e a produção de textos. O resultado é que agora só acredito na utilidade da minha aula se o conhecimento construído estiver diretamente ligado ao caráter sociopragmático da língua. Em outras palavras, o ensino de uma regra, a leitura de um texto e a produção textual necessariamente têm de estar relacionados com o uso real da língua. Ao solicitar que o aluno escreva, por exemplo, procuro enfatizar a situação sociocomunicativa que envolve essa produção: seus interlocutores, sua intencionalidade, seu contexto histórico ou social, sua função social, etc.
O estudo do Módulo II foi enriquecedor. Ficou claro que ensinar a língua é, principalmente, investir em práticas pedagógicas que reiterem o seu aspecto sociopragmático. Segundo BORTONE (2008),o professor deve buscar nas novas teorias uma metodologia que possibilite o desenvolvimento da competência interacional dos alunos (tanto na escrita quanto na modalidade oral) para que eles possam fazer uso da língua com competência comunicativa. Sendo assim, não faz mais sentido o ensino exclusivamente metalingüístico voltado para o aprendizado das regras da gramática normativa. É fundamental que o professor saiba trabalhar com atividades e pesquisas que levem a turma a perceber a funcionalidade dos mais variados usos da língua em seus mais variados contextos.
A partir do momento em que o professor passa a trabalhar a norma padrão vinculada a situações reais de uso, o ensino da língua passa a privilegiar a inserção, de forma autônoma e consciente, de indivíduos na cultura letrada e, além disso, torna-os capazes de ampliar a sua capacidade de monitoramento da língua de acordo com as exigências de cada situação discursiva ou conforme as suas intenções. Nesse contexto, as aulas deixam de ser a mera e monótona reprodução de normas gramaticais e tranformam-se em um democrático ambiente onde " a gramática da norma padrão precisa ser ensinada de uma maneira reflexiva e inserida em contextos discursivos para, dessa forma, possibilitar ao aluno o domínio desta norma e, assim, poder monitorar seu estilo de fala" (BORTONE, 2008: 29).

(20/11) Tecendo textos/ Encontro XXVIII

A escrita na sala de aula deve ter sentido e objetivo reais. Não é mais concebível gastarmos nosso tempo e o tempo do nosso aluno com a leitura e a escrita de textos, cuja única finalidade seja receber uma nota. Mais uma vez, vale lembrar que todo texto cumpre uma finalidade social específica e que, justamente por essa razão, organiza-se também de uma forma específica. Portanto, não existe uma fórmula para a "boa escrita". Diante disso, o professor deve abandonar as velhas planilhas-padrão de correção textual e adotar novos critérios à medida que forem produzidos novos gêneros. Os elementos que tornam um texto coerente e coeso podem ser os responsáveis pela falta de coesão e de coerência de outro. Ou ainda: construções coloquiais podem ser completamente inadequadas a determinados textos e excelentes recursos expressivos em outros. Nessa perspectiva, trabalhar os problemas de organização textual implica, em primeiro lugar, destacar a finalidade do texto que se escreve, para quem se escreve e a situação na qual se escreve. O segundo passo refere-se à avaliação do texto produzido. O professor deve estabelecer etapas para essa avaliação e nunca avaliar todos os aspectos do texto de uma só vez. A avaliação deve ser processual. No lugar de uma nota, o professor deve discutir com o aluno como foi o seu desempenho em relação a determinado aspecto. Se a produção textual visava avaliar o uso dos elementos coesivos, nesse momento, a ortografia, a acentuação gráfica e a colocação pronominal, por exemplo, não podem determinar a avaliação. Esses aspectos devem ser considerados nas outras leituras que o professor fará desse mesmo texto.

(13/11) O reino das fábulas e das piadas/ Encontro XXVII

Se já está clara a necessidade de se trabalhar a leitura na escola sob uma perspectiva intersemiótica, também deve estar claro que a seleção de textos pelo professor deve levar em conta as experiências e o conhecimento prévio do seu aluno. Nesse sentido, as fábulas e as piadas podem servir como excelente material para o desenvolvimento de leitores proficientes. Ambos os gêneros, além de valorizarem a linguagem mais próxima da fala das crianças e dos adolescentes, constituem-se, normalmente, de narrativas breves sobre situações que remetem ao cotidiano, isto é, são histórias perfeitamente "aplicáveis" às experiências de vida da turma. Quando se fala da dimensão infratextual, das pistas que levam às inferências, nada melhor do que o trabalho com a piada. Esse gênero textual é rico em estereótipos (o baiano preguiçoso, o português burro, o nordestino machista, etc) e em convenções culturais ( o padre que não pode namorar, o pai que quer a filha virgem até o casamento, etc) que estimulam o aluno a recorrer aos seus conhecimentos prévios para identificar o humor. Em outras palavras, a leitura de piadas em sala de aula leva o aluno a perceber que nem tudo está dito no texto, que ele deve acionar as suas experiências de mundo ( episódios vividos e/ou outros textos lidos) para que seja um leitor proficiente.

(06/11) Dois dedos de prosa/ Encontro XXVI

Um dedo de prosa

De acordo com Cristina Damim e Marinella Stefani Peruzzo (2006), a avaliação dos dicionários escolares deve obedecer a dois critérios:
a) Critérios lingüísticos (baseados nas características das línguas e/ou de uma teoria da linguagem): tipo de informação oferecida (lingüística, enciclopédica ou mista), forma de acesso, densidade da nomenclatura (quantidade de artigos léxicos), tipo de linguagem da definição4 (com linguagem adaptada ou não ao seu público), informações microestruturais (separação silábica, pronúncia, classe gramatical, exemplos, sinônimos, antônimos, definição, indicações de uso, remissões, diminutivo, aumentativos, flexões);
b) Critérios de funcionalidade (aqueles que dizem respeito à relação entre o consulente e o uso que fará da obra): seleção macroestrutural (tipos de unidades escolhidas para figurar na macroestrutura: palavras e/ou “coisas”), finalidade/função (ajudar o usuário a conhecer as palavras, estabelecer relações entre as coisas e seus nomes, oferecer significados, informações gramaticais e informações para codificação e outras), público-alvo e suas necessidades (usuário identificado pela relação entre suas necessidades lingüísticas e grau de escolaridade), contextos em que é usado (etapas escolares e usos fora da escola), presença de ilustrações (essenciais ou adicionais), projeto gráfico-material (tamanho das letras, tipo de papel, uso de cores, dentre outros).
Em síntese, mais importante do que esses critérios deve ser a preocupação do professor com a clareza e a objetividade das definições e a adequação do dicionário às necessidades e aos interesses dos alunos. O que não pode mais ocorrer em sala de aula é a consulta a um dicionário que confunde, distorce significados e ratifica preconceitos.
Outro dedo de prosa
Em muitas ocasiões, quando se trabalha a leitura em sala de aula, o professor enfatiza tão somente os aspectos lingüísticos do texto. Essa prática condiciona o aluno a pensar que ler bem significa apenas decodificar os significados das palavras e, dessa forma, ele passa a entender- equivocadamente- que, quanto maior for o seu acervo lexical, maior será o seu domínio da leitura. Quem nunca ouviu o seu aluno dizer, por exemplo, que o texto estava difícil porque ele não conhecia determinadas palavras?
Em pleno século XXI, quando o mundo assiste a uma intensa e diversificada (r)evolução da comunicação, a escola tem o dever de mudar a sua postura diante do texto. O aluno só será capaz de ler com proficiência quando o professor levá-lo a ultrapassar a dimensão explícita do texto, quando ele for capaz de compreender que todo texto cumpre uma finalidade social e que, portanto, está inserido em uma situação sociocomunicativa. Dito de outra maneira, o aluno só será capaz de entender os pressupostos e subentendidos de um texto quando tiver contato em sala de aula com uma prática de leitura que envolva todas as dimensões textuais: o contexto social a que o texto se refere, as estratégias que o autor usa para desenvolver o tema, as pistas no texto que levam às informações inferenciais, as marcas estilísticas e coesivas que definem o gênero do texto e a intertextualidade presente no texto. Portanto, trabalhar a leitura na escola significa explorar o texto como um corpo lingüístico que veicula intenções e experiências de mundo e que, por essa razão, exige a intervenção do leitor como um ser crítico e com um horizonte de experiências indispensável para uma leitura proficiente.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

(30/ 10) A teoria na prática/ Encontro XXV

Depois de duas semanas voltadas para o estudo e a discussão do assunto “Norma padrão e variedades lingüísticas”, propus à turma uma atividade avaliativa, chamada “Construção em Parceria”, que deveria ser realizada em dupla. Assim, cada grupo recebeu dois textos (na verdade, dois bilhetes redigidos por mim), que apresentavam o mesmo conteúdo: o remetente (Edson), por ocasião do aniversário da sua namorada, solicitava ao destinatário um empréstimo para poder presenteá-la com um CD. Todavia, a diferença fundamental entre os dois textos estava na linguagem empregada. No primeiro caso, o destinatário era Daniel, o melhor amigo do Edson, que nessa situação comunicativa, optou pela linguagem coloquial. Já no segundo caso, o pai da namorada do Edson era o seu interlocutor, circunstância que determinou o uso da norma padrão.
Após a leitura desse material, solicitei à turma que identificasse essa diferença, ao que a maioria correspondeu positivamente. Em seguida, reforcei os conceitos de norma padrão e de variedades lingüísticas e redigi no quadro as seguintes questões, que deveriam ser discutidas e respondidas por escrito pelas duplas:
1.Ambos os textos apresentam o mesmo conteúdo. Identifiquem-no e registrem a sua resposta abaixo.;
2.Considerando que o destinatário de cada um dos bilhetes é diferente, expliquem por que o Edson optou por uma linguagem também diferente em cada um deles.;
3.Confrontando os dois textos e baseando-se na resposta à questão anterior, é correto dizer que só usa a linguagem coloquial quem não domina a norma padrão? Por quê?;
4.Diante das situações apresentadas pelos textos, escrevam um breve comentário sobre a importância do ensino da norma padrão da língua portuguesa.;
5.Agora, coloquem-se no lugar do Daniel e escrevam um bilhete ao Edson respondendo ao seu pedido.
Além de avaliar o conhecimento dos alunos sobre o assunto em pauta, essa atividade pretendia verificar o resultado das discussões, audições e leituras que desenvolvemos nas aulas acerca do preconceito lingüístico, das relações de poder e da exclusão social determinadas pelo uso da língua, da importância do saber adequar a linguagem a cada situação comunicativa e do porquê estudar a língua portuguesa na escola. A opção por esse instrumento avaliativo visava, também, diagnosticar como os alunos lidariam com a divisão de tarefas, o saber ouvir e falar, a argumentação e a expressão escrita. Com esse intuito, procurei acompanhar todas as duplas durante a atividade com intervenções e provocações.
Apesar de bastante heterogêneos, foram três os resultados mais marcantes dessa avaliação. Em primeiro lugar, a maioria da turma, embora tenha correspondido de forma satisfatória às questões 1, 2 e 3, apresentou comentários pouco ou nada consistentes sobre a questão 4: de acordo com quase todas as duplas, conhecer a norma padrão significava apenas comunicar-se melhor, o que desmerecia, portanto, a eficiência comunicativa do bilhete direcionado ao melhor amigo do Edson. Em segundo lugar, ao redigirem o texto, conforme a solicitação da questão 5, cerca de 50% das equipes empregaram a norma padrão e tentaram compor, surpreendentemente, um discurso formal, totalmente inadequado para a situação proposta. Por último, do universo de 22 duplas, 17 demonstraram dificuldades com a expressão escrita. As construções precárias, a falta de seqüência lógica do raciocínio e as falhas na coesão foram os problemas mais freqüentes na redação das respostas.
Com base nessas e outras informações, percebi que a atividade foi produtiva para os alunos, uma vez que, partindo de uma situação muito próxima da sua realidade, consegui quebrar “o gelo”, sensação desfavorável a um momento de avaliação. Além disso, o trabalho em parceria propiciou o diálogo, a divisão de tarefas e a construção de conhecimento, habilidades e competências desprestigiadas pela “prova”. Para o professor, foi uma excelente oportunidade para conhecer a realidade que permeia o dia-a-dia em sala de aula: os erros e os acertos de certas ações pedagógicas, as reais necessidades e os interesses dos alunos e a importância da relação dialógica entre os sujeitos da aprendizagem em busca da construção de conhecimentos significativos. Entretanto, esse instrumento, de certo modo, impediu uma identificação mais precisa da aprendizagem individual do aluno: as dificuldades, as dúvidas, as opiniões e as descobertas de cada um deles em particular foram, em parte, “camufladas” pelo trabalho em dupla, como pude constatar com falas do tipo: “Se eu tivesse escrito ou fizesse sozinho, não haveria esse problema.”.
Diante dessas constatações, ao analisar cada atividade, resolvi fazer apenas comentários sobre as respostas (apontando os problemas e reconhecendo os avanços) sem atribuir nota a elas. Ao conhecerem o seu desempenho, as duplas reagiram de uma forma interessante: ao mesmo tempo em que estranharam a falta de uma nota, sugeriram uma tranqüilidade não muito comum em dia de entrega de “prova”. Com as atividades em mãos, solicitei que cada dupla lesse atentamente os meus comentários para que, juntos, identificássemos as razões para o resultado do trabalho. Depois dessa discussão, propus à turma, na aula seguinte, que me sugerisse outras possibilidades de abordagem desse conteúdo e outros mecanismos de avaliação da aprendizagem. Também definimos que, em outro momento, retomaríamos essa atividade para desenvolvermos um estudo sobre coesão e coerência.

(23/10) Como encarar o erro?/ Encontro XXIV

Ao rejeitar a noção do “erro” e defender a variação e a mudança lingüística, o professor abre um precedente para a reflexão sobre o aspecto sociopragmático da língua, ponto crucial para o desenvolvimento da competência interacional do aluno. De acordo com a metodologia interacionista, não existe uma fala certa ou errada, mas sim uma fala adequada ou inadequada a uma situação comunicativa. Portanto, “a gramática da norma padrão precisa ser ensinada de uma maneira reflexiva e inserida em contextos discursivos para, dessa forma, possibilitar ao aluno o domínio desta norma e, assim, poder desenvolver a capacidade de monitorar seu estilo de fala” (BORTONE, 2008: 29). Sendo assim, o professor não pode restringir-se apenas ao ensino dos aspectos lingüísticos da fala, mas sim priorizar o ensino da língua vinculada às suas situações de uso. A escola tem o dever de garantir uma educação baseada no pressuposto de que “toda e qualquer variedade lingüística é plenamente funcional, oferece todos os recursos necessários para que seus falantes interajam socialmente, é um meio eficiente de manutenção da coesão social da comunidade em que é empregada” (BAGNO, 2007: 48) e, além disso, tem organização gramatical, segue regras e tem uma lógica lingüística perfeitamente demonstrável (PERINI, 2004).